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Encarceramento em Massa, Enfrentamento ao Racismo, Nota Pública

4 motivos para barrar projeto de lei sobre identificação do perfil genético de pessoas condenadas

Publicado em: 26/04/2023
Escrito por: Foto: Agepen/MS

REDE JUSTIÇA CRIMINAL ELENCA 4 MOTIVOS PARA A NÃO APROVAÇÃO DO PL 1496/2021 E PELA NECESSIDADE DE MAIOR DEBATE PÚBLICO SOBRE O USO DE MATERIAL GENÉTICO EM INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS

A Rede Justiça Criminal publica nota visando contribuir para o debate do Projeto de Lei nº 1496 de 2021, que altera o art. 9º-A da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execução Penal, para dispor sobre a identificação do perfil genético de pessoas condenadas. Entenda:


 

Uso de bancos genéticos no Brasil: um breve histórico

A existência de bancos genéticos no país é relativamente recente, tendo sido introduzidos em 2012 no ordenamento jurídico brasileiro pela lei no 12.654/12 e regulamentados pelos decretos no 7.950 de 2013 e 9.817 de 2019. Ainda em 2019, a chamada Lei Anticrime (12.037/19) incluiu diversos parágrafos em seu artigo 9°-A e determinou que a identificação genética deve ser feita, de maneira obrigatória, nos casos de crimes dolosos com violência ou hediondos, inclusive para presos provisórios, cabendo punição em caso de recusa.

A discussão em torno do tema enfrenta sérios questionamentos desde sua implementação, chegando, inclusive, ao plenário do STF.  Os problemas mais suscitados dizem respeito à violação do direito do acusado ao tratamento humano digno, ao direito de não se autoincriminar, à presunção de inocência, à intimidade e ao esquecimento.


 

4 MOTIVOS PARA A NÃO APROVAÇÃO DO PL 1496/2021

  1. O PL 1496/2021, além de não sanar problemas já apontados em leis anteriores, falha novamente ao não promover amplo debate público sobre as consequências éticas e jurídicas da manipulação de material genético. A justificativa do texto não traz dados científicos amplos e atualizados sobre a eficácia do uso do banco genético na elucidação de crimes, nem de possíveis efeitos de dissuasão à prevenção ou reincidência de novos crimes. Além disso, o PL também não apresenta, como projetos passados, estudo de impacto financeiro quanto à implementação.
  2. É mentiroso e irresponsável afirmar que qualquer pessoa vinculada a equipes de saúde, desde que capacitada, possa realizar a coleta do material genético. Tal afirmação ignora por completo a realidade precária do sistema prisional brasileiro, já reconhecido por seu estado de coisas inconstitucional. É amplamente sabido que a maioria dos estabelecimentos prisionais não conta sequer com equipe de saúde, sendo lugares altamente insalubres e sem fiscalização adequada.
  3. A resolução no 9 de 2018, do Comitê Gestor da Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos, sob tutela do Ministério da Justiça, padronizou os procedimentos relativos à coleta compulsória do material genético. Nela não há previsão de que a coleta seja de responsabilidade das unidades prisionais, o que além de ignorar o que dita a lei, desconsidera a realidade de cada estado brasileiro, onerando os executivos estaduais. Além disso, a prova obtida mediante perícia técnica deve seguir padrões formais  rigorosos, sem os quais há risco de condenações equivocadas, sobretudo pela ausência de previsão de salvaguardas e mecanismos de responsabilização contra a contaminação e mistura de materiais genéticos, adulterações e imprecisões, dentre outras exigências.
  4. O PL viola direitos e princípios constitucionais. A história brasileira se caracteriza pela exclusão social e racial, marcada por um passado não tão distante de teorias pseudocientíficas usadas para chancelar uma política de eugenia. O mal uso dos dados genéticos de condenados poderá fomentar um banco de suspeitos preferenciais que ficarão por tempo indeterminado com o estigma de “possíveis culpáveis”, reforçando, assim, a estigmatização e seletividade do sistema carcerário brasileiro, que atinge prioritariamente jovens, pobres e negros.